Fonte: Internet. |
Ainda
outra introdução ao método de Silvio Gallo.
Yure
Cézar de Moura Almeida
(Filósofo)
Resumo.
Este
trabalho visa a apresentação da situação metodológica atual do
ensino brasileiro de filosofia, uma crítica aos métodos vigentes e
o auxílio na escolha de um novo método.
Atualmente
o ensino de filosofia é regido por duas grandes correntes
metodológicas: o estruturalismo e o tematismo,
ambos com seus problemas.
Enquanto
que o estruturalismo tem problemas centrados no método em si, o
tematismo tem seus problemas centrados na habilidade do professor e
nas consequências práticas de sua aplicação.
O
melhor método seria aquele que assegurasse o contato com a história
da filosofia sem entediar o aluno e ainda assim permitir que o aluno
seja capaz de receber, filtrar e criticar a tradição, exercitando
assim seu pensamento autônomo.
Palavras-chave:
filosofia, metodologia, educação, ensino.
Abstract.
This
work aims to present the current methodological situation in the
Brazilian philosophy education, to criticize the accepted methods and
to help in the choice of a new method.
Currently,
the philosophic education is sustained by two big methodological
strategies: the structuralism and the thematic method, both with
their problems.
While
the structuralism has method-centered problems, the thematic method
has problems centered on the teacher’s skill and the practical
consequences of it’s application.
The
best method would be another, where the contact with the history of
philosophy would be kept without boring the student and, even so,
allowing the student to receive, filter and criticize the tradition,
exercising their autonomous thought.
Keywords:
philosophy, methodology, education, teaching.
Introdução.
A filosofia
é tida como a mãe de todas as ciências, o que é verdade até um
distante ponto. Dela surgiram vários saberes que hoje se utilizam de
um método mais profundo e exigente de pesquisa, como a física.
Mesmo que hoje, com cada vez mais áreas do saber utilizando o método
científico, seja uma época em que o terreno da filosofia séria vem
sendo limitado, a tendência não é de que a filosofia desapareça,
mas que ela encontre seu terreno de direito, um terreno onde outras
formas de pensamento não podem penetrar por causa das limitações
do método que utilizam.
Apesar da
importância histórica da filosofia, ela nunca foi levada a sério
no Brasil até 2009, quando ela voltou, após uma longa ausência, ao
currículo escolar obrigatório. Agora que pesquisas cada vez mais
profundas são feitas no terreno do ensino de filosofia, a aula desta
disciplina torna-se mais distinta e única, em relação ao ensino
das outras disciplinas. A filosofia não usa, nem poderia usar, o
método científico; seus instrumentos de trabalho são a reflexão e
a discussão (crítica). Mas trazer esses elementos para a sala de
aula é uma tarefa complexa, especialmente considerando que a
tendência que se observa ao apresentar o método filosófico
para alunos de ensino médio é que a aula se torne uma conversa
banal e não sistemática.
Por outro
lado, uma concepção estruturalista, mais detalhada e mais
organizada em muitos aspectos, pode entediar o aluno e afastá-lo da
filosofia da mesma forma que ele é afastado das outras disciplinas
que não lhe interessam.
Aqui
discutiremos qual o melhor modo de ensinar filosofia, no qual o
respeito pela tradição seja mantido e se assegure ao aluno um amplo
espaço para sua liberdade de pensamento. Na primeira parte,
será explicitada a situação atual do ensino de filosofia no
Brasil. Na segunda parte, nos detemos na crítica aos modelos
existentes. Na última parte, será proposto um outro modelo
que poderia substituir os modelos que temos.
By Santiago Caruso. |
Primeira parte.
Quando os
jesuítas decidiram cristianizar os nativos brasileiros, a filosofia
também foi ministrada. A ideia era usar bases mais ou menos
racionais para fundamentar a fé que estava sendo propagada no
Brasil, por isso a filosofia ensinada no território nacional era de
teor fortemente aristotélico e tomista, visto que São Tomás de
Aquino havia contribuído grandemente com a filosofia cristã e visto
que este se baseou em Aristóteles para construir seu sistema. Como
orientação sobre o que se devia ou não ensinar, se tinha a ratio
studiorum, um tomo que também orientava os jesuítas em outras
coisas.1
O método de ensino de filosofia mudou desde então.
Por fim, o último modo moderno de se estudar filosofia teve seu princípio no século XX, marcado pela profissionalização e especialização dos estudos universitários. Seu marco foi na década de 1940 com a missão francesa na USP, introduzido por Martial Gueroult e Victor Goldschmidt. Contudo, o estudo da história da filosofia baseado apenas em comentários ocasionou a pouca produtividade filosófica no país como é atestada por Roberto Gomes no livro A Crítica da Razão Tupiniquim (1977).2
E
é notável como os comentários são muito mais comuns que obras
filosóficas de fato no terreno do ensino, tanto básico como
superior, inclusive porque traduções são escassas. Mas a tentativa
de ministrar textos filosóficos aos alunos em vez de comentários
tem fracassado também por não haver um método sólido de preparar
esses alunos para o texto filosófico. O comentário normalmente se
expressa por uma linguagem mais acessível, por ter sido escrito num
período mais próximo ao nosso, poupando os alunos de ter de
contextualizar o filósofo e interpretar sua linguagem, adequada à
sua época.
Outro
problema que se constitui no nosso ensino é o fato de que pessoas
que se qualificam para ensinar, por vezes, não assumem o cargo. A
forma como o ensino é visto no Brasil, de maneira geral, desencoraja
aqueles que se formam e afasta alunos potenciais que poderiam se
qualificar. Assim, há uma falta de professores, principalmente de
filosofia, porque nosso contexto positivista leva muitos a acreditar
que a filosofia foi superada e não faz mais sentido ser ensinada.
Mas como o ensino de filosofia tornou-se obrigatório, muitos
professores que ousam ensinar filosofia não são qualificados para
isso, sendo, na verdade, professores qualificados em história,
sociologia e outras humanidades. Outra razão que reforça essa
realidade é de que os professores de filosofia, no período
ditatorial, acabavam por ter de ensinar essas disciplinas. O terreno
da filosofia ficava então mesclado com o terreno de outras
humanidades.
O Ensino da Filosofia havia como parte obrigatória do ensino médio, até que em 1961 a Lei 4.024/61 extirpou essa obrigatoriedade. A retomada do ensino da filosofia no ensino médio, a partir da década de 1990, com a criação dos parâmetros curriculares, em resposta à Lei 9394/96, a LDBE, oferece uma visão do que seria imprescindível de ser ensinado. [….] Foi durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva que seu ensino se tornou obrigatório. Isso abriu um campo de trabalho que estava represado para os licenciados em Filosofia (que antes deviam se restringir a serem professores de História, Sociologia ou Geografia).3
Outro
problema, aponta Pimenta4,
é a formação inadequada daqueles que assumem o cargo. Os
professores não criticam, não foram formados para criticar os
textos que leram exaustivamente na universidade. Foram treinados para
repetir e canonizar os textos e ministrá-los passivamente aos alunos
como “a verdade”. É a crítica que comumente se faz à
universidade brasileira de filosofia: não se formam filósofos, mas
comentadores.
Observe,
contudo, que a volta da filosofia ao currículo escolar não ocorreu
de forma imediatamente satisfatória, sendo meramente um “tema
transversal” antes de se tornar uma disciplina de fato. Agora,
temos material que regula o ensino de filosofia no ensino médio (os
Parâmetros) além de várias orientações (como a Escola
Aprendente), embora a quantidade de professores ainda seja um
problema a ser resolvido. Isso porque uma das “razões” para não
se incluir a filosofia no currículo era justamente a falta de
professores, mas a quantidade de professores não pode deixar de ser
problema se a filosofia não se tornar obrigatória.
O método
também constitui um problema e esse é o pior problema. Desde a
volta do ensino de filosofia à seara da obrigatoriedade, temos nos
perguntado como ensinar filosofia. Existem duas formas de ensinar
filosofia atualmente:
-
O método estruturalista, no qual se ensina a história da filosofia de forma linear.
-
O método temático, no qual são selecionados temas que são discutidos filosoficamente na classe.
Ambos os
métodos não são propriamente usados todas as vezes que são
empregados. O método estruturalista pode entediar o aluno, enquanto
que o método temático pode tornar-se “papo furado”.
O método
estruturalista, ou estrutural, começou a ser ministrado no Brasil na
década de quarenta, importado da França.5
[…] não pode existir filosofia em detrimento da história da filosofia. […] O PCN (1999:331), no que tange à filosofia, é tributário do método estruturalista, porém adiciona aspectos negligenciados pela prática estruturalista no Brasil, a saber, a crítica e a reflexão, a partir dos clássicos da história da filosofia, sobre a realidade contemporânea.6
O
método estrutural é notavelmente mais aceito, principalmente no
ensino superior, por permitir que os alunos entrem em contato com a
tradição e por ser relativamente fácil de aplicar, mas é penoso
que o aluno aprenda a história da filosofia sem relacioná-la à sua
experiência vital. Ele se pergunta “Por que estou a estudar isto?
Que importância isto tem na minha vida?” E pela mesma razão que
ele o faz quando estuda outras disciplinas que não lhe enriquecem ou
que, pelo menos, não o fazem se sentir enriquecido. Além disso,
alguém pode argumentar que simplesmente estudar a história da
filosofia não forma o filósofo.
[…] a simples leitura, com a finalidade em si mesma é debalde. Fazer filosofia é dialogar com sua história [….]7
Por
isso os Parâmetros sugerem que as ideias filosóficas discutidas na
tradição devam ser atreladas ao nosso tempo, para que o aluno
constate que a filosofia tem sua importância no contexto dele
também. A tradição precisa não apenas ser refletida, mas também
criticada. Esse é o método filosófico. Mas o estudo da tradição
por vezes não interessa ao aluno e é por isso que o método
estrutural é tão criticado. O método temático surge então como
resposta, ao procurar com os alunos os temas que lhes interessam,
para só então ver o que a tradição tem a dizer sobre aquele tema.
Isso permitiria tanto uma ênfase no pensamento contemporâneo como nos clássicos da filosofia ocidental. Ainda, seria menos dogmático do que estudar somente um pensador ou uma obra, pois o aluno teria mais condições de, em uma mesma temática, avaliar teses diferentes e formular com maior consistência as suas, o que não o ocorreria se o curso fosse, exclusivamente, por exemplo, sobre a compreensão de linguagem em Wittgenstein.8
Mas,
ao fazer isso, se negligencia muitas questões importantes que
precisam ser tratadas, questões que são negligenciadas simplesmente
por não interessarem aos alunos. O grande problema da abordagem
temática se constitui justamente na escolha dos temas e na forma
como estes são tratados, especialmente na ausência de textos
filosóficos da tradição sobre questões muito íntimas do nosso
tempo, como a homossexualidade, a Internet e outras coisas que
professores jovens se sentem tentados a tratar, mas não encontram
material necessário, seja porque não há traduções, seja porque
as traduções que existem são raras e caras. Que filósofo da
tradição reflectiu sobre esses temas? Mas são temas que interessam
aos alunos. Uma saída seria a expansão do tema. Em vez de falar de
Internet, falar de comunicação, que é um tema tratado pela
tradição, ou de informação, ainda de alienação, mas mesmo isso
carece de um método sólido que realmente oriente o professor.
Fonte: Internet. |
Segunda parte.
Agora
temos as duas vertentes principais que caracterizam a querela dentro
do ensino brasileiro de filosofia. Criticaremos ambas mais
detalhadamente.
A
concepção estrutural da filosofia é boa em diversos aspectos,
notavelmente porque põe o aluno em contato com a história da
filosofia. O aluno vê todas as ideias mais importantes dos filósofos
clássicos, modernos e contemporâneos, de forma que ele seja capaz
de fazer seus próprios paralelos entre as ideias desses filósofos e
sua própria vida. É fácil de aplicar e fácil de manter um curso
dessa forma, posto que a ordem já está dada, a ordem cronológica,
poupando o professor de um planejamento longo. A ordem é cronológica
porque o método estruturalista aplicado ao ensino médio tem suas
preocupações de entendimento textual modificadas pela demanda do
conteúdo curricular. Então, para conciliar os temas que devem ser
tratados no ensino médio com a preocupação pelo entendimento do
texto, a ordem cronológica, que muitas vezes se identifica com uma
abordagem cartesiana que leva do mais simples ao mais complexo, é
recomendável. Mas a abordagem estrutural tem três grandes defeitos.
O
primeiro é que ela pode reduzir a filosofia à sua história,
deixando pouco espaço para a formação do pensamento autônomo.
Dizem que não se pode ensinar a filosofar, mas se pode ensinar
filosofia, mas o que é ensinar filosofia se não ensinar a
filosofar?
A afirmativa de Kant “Não se ensina Filosofia, mas a filosofar”, enseja uma série de questionamentos acerca do ensino de filosofia. A assertiva coloca uma questão importante, ou seja, se não se ensina filosofia, mas a filosofar, como se ensina a filosofar? Nesse sentido, há um ponto de partida importante que, por analogia, pode conduzir o raciocínio a partir da ideia de que em educação só se aprende “fazendo”. O ato de aprender está vinculado ao ato de fazer, ou seja, de inserir os conteúdos teóricos nas práticas em torno do objeto que se deseja conhecer. O raciocínio pode ser transportado analogicamente para o ensino de filosofia para concluir, pelo menos provisoriamente, de que se ensina a filosofia “filosofando”, daí poder-se inferir, por extensão de raciocínio, que “não se ensina a filosofia, mas a filosofar”.9
Ensinar
a história da filosofia tira o caráter do curso, transformando-o em
um curso de história. O aluno mais original pode criticar as ideias
dos filósofos por conta própria, desenvolvendo um pensamento mais
original, mas, sem a devida formação, ele pode acabar por ficar
apenas no terreno da opinião.
O
segundo defeito é apontado por Morton:
[…] ouvir longas lições torna o espírito dos estudantes passivo, receptivo (quer dizer, quando estão acordados), com as faculdades críticas essenciais para a filosofia desligadas.10
O
último grande problema reside na linearidade do curso, sugerindo que
algumas doutrinas são “ultrapassadas”, sendo que não existe
filosofia ultrapassada; sempre o filósofo se vê obrigado a recorrer
a tradição para continuar seu próprio pensamento (como o
contemporâneo Heidegger recorreu ao pré-socrático Parmênides).
Isso se evidencia mesmo na ciência. Quando um aluno vê, por
exemplo, que Kant vai além de Hume ou que Schopenhauer tece duras
críticas a Hegel, ele tende a ver as coisas como na história: Hume
e Hegel foram ultrapassados pelos seus “sucessores”, o que é
muito distante da verdade.
Então,
o melhor método de ensinar filosofia poderia ser a antítese do
estruturalismo, o temático, que ensina a filosofar tendo um tema
aleatório como ponto de partida? Na medida em que o temático
assegura três passos importantes, segundo Borges, apontados por
Luckesi:
Destarte, LUCKESI (1992), sintetiza três passos do filosofar: (i) inventariar os valores vigentes; (II) criticá-los; (III) reconstruí-los. É um processo dialético que vai de uma determinada posição para a sua superação teórico-prática.11
Esse
é um modo bem hegeliano de se encarar a educação, mas, diferente
do que se espera de uma abordagem hegeliana, faz todo sentido. O
problema do temático é justamente a inaptidão de muitos
professores em assegurar esses três passos. Inventariar valores é
fácil, até certo ponto, mas o problema começa a surgir na crítica:
os professores têm medo de confrontar os alunos, talvez os
professores sejam conservadores demais, talvez os professores
defendam justamente a ideia que a disciplina ou a ementa se propõe a
criticar ou, pior, talvez os professores não acreditem que a crítica
feita em sala de aula tenha algum impacto a longo prazo na vida do
aluno. A crítica é o estágio mais difícil e, enquanto não se faz
crítica, não se reconstrói, se conforma. A disciplina de filosofia
torna-se, então, acrítica.
Além
do mais, enquanto o método estruturalista procura utilizar obras
filosóficas, o tematismo procura apoio em livros didáticos.
Um livro didático comum não traz textos filosóficos em sua
completude, mas resumos e paráfrases. Ou seja, é um comentário,
por vezes escrito por um historiador. Isso pode levar o aluno a
subestimar o pensamento de determinado filósofo nem tanto por seu
pensamento, mas pelo pensamento do comentador. O ideal seria
ministrar os textos filosóficos em seus estados puros, mas isso não
é fácil: os textos filosóficos
vêm com a linguagem do tempo e do terreno do filósofo que escreveu
o texto. A linguagem é difícil e distante da do aluno. Sem falar
que o aluno, ao se deparar com um texto filosófico, pode sentir-se
sobrepujado e tratar o texto como dogma, mesmo quando ele não
entende exatamente o que está escrito. Logo, mesmo que se quisesse
substituir o livro didático pelo texto filosófico, o aluno
precisaria aprender a “ler de braços cruzados”, a ler sem
intenção de aceitar tudo o que está escrito no texto como
eternamente válido e ser capaz de criticar o que está escrito,
coisa que não é encorajada em nenhuma outra disciplina.
Assim,
enquanto que o problema do estruturalismo se encontra no método, o
problema do temático se encontra no professor.
Última parte.
Observamos
que ambos os métodos têm pontos fortes e fracos. Existem meios de
se usar os dois de forma que os problemas de um sejam amenizados
pelos pontos positivos do outro.
O
temático não tem problemas estruturais como o estruturalismo tem,
embora seja algo bem mais subjetivo e “solto”, além de difícil
de aplicar. Então, após a escolha do tema, poderíamos seguir
explicando o que a tradição, cronologicamente, pensa acerca daquele
tema. Um livro que faz isso muito bem é a Antologia Ilustrada de
Filosofia: das Origens à Idade Moderna, escrito pelo italiano
Ubaldo Nicola e publicado no Brasil em 2005 pela editora Globo. Ele
pode ser lido linearmente, como uma história da filosofia, mas o seu
primeiro índice é temático. Isto é, o escritor elabora
perguntas que ele considera importantes para a tradição filosófica
e, em seguida, diz que filósofos argumentaram sobre aquela questão
e onde a resposta deles pode ser encontrada no livro. Por exemplo:
O QUE É O AMOR?
PLATÃO: A escala de graus de Eros […]
CAMPANELLA: O amor entre os solares […]
MORUS: Amor e guerra entre os habitantes de Utopia […]
KIERKEGAARD: O sedutor é o instante fugaz […]
SCHOPENHAUER: Não existe amor sem sexo […]12
Isso ameniza
os problemas do estruturalismo (“longas lições cansam o aluno”,
“redução da filosofia à sua história” e “crença de que há
filósofos ultrapassados”), além de manter o ponto positivo mais
forte do temático, que é justamente a facilidade do aluno de anelar
o pensamento filosófico com o seu, refletindo a partir de temas que
podem lhe interessar. Mas ainda existe um problema com esse método
híbrido: por vezes o tema escolhido é desinteressante. Como
propriamente fazer o aluno se interessar pelo assunto, sem perder a
carga filosófica da aula?
Existe uma
recente moda na qual o ideal para a aula de filosofia ser
interessante, não obstante o tema, seria a sensibilização
do aluno para o tema tratado. Isso deve ser feito como uma ponte, que
liga o tema à vida do aluno. Por exemplo, se você tratar de
percepção do real, você pode começar sensibilizando a turma com o
assunto das drogas e de como elas alteram a nossa percepção do
real. Em seguida, incutir no aluno a ideia de que nem tudo o que
vemos, ouvimos, sentimos é real, posto que alterações no estado
psíquico nos levam a perceber coisas que, na verdade, não estão
lá. Aí está o gancho para toda uma discussão acerca do que é
realidade, do que é aparência e ainda o gancho para a discussão
filosófica milenar sobre a diferença entre sonho e vigília. Isso
funciona melhor do que começar a aula forçando Descartes ou
Schopenhauer sobre a turma.
Mas,
simplesmente sensibilizar não torna a tarefa de ensinar filosofia
exatamente “fácil”. O método prossegue com outras três etapas.
Partindo do pressuposto, segundo Silvio Gallo e Renata Aspis, que Filosofia é a experiência fundamentalmente do pensamento, que nos permite equacionar um determinado problema e que o principal objetivo da aula de filosofia é oportunizar ao estudante a possibilidade da experiência filosófica, isto é, a experiência com o pensamento conceitual, o professor do Ensino Médio pode e deve viabilizar essa perspectiva na disciplina Filosofia através do exercício que todos os filósofos sempre fizeram, isto é, recomeçar para depois avançar. Na prática, os autores elencaram quatro etapas do método: sensibilização, problematização, investigação e conceituação. 13
Seguir essas
etapas tornariam o ensino de filosofia consideravelmente mais fácil
e organizado, sem deixar o professor perdido como no método temático
tradicional, mas é também um método que requer prática, pois o
professor precisa despender o tempo devido a cada etapa. Por exemplo,
um professor poderia abusar da sensibilização e deixar de lado as
outras três etapas, acidentalmente fazendo com que uma lição tome
mais tempo do que deveria. É um método que funcionaria melhor em
aulas geminadas; sua aplicação numa aula semanal de cinquenta
minutos é muito corrida e o assunto pode ficar “atropelado”.
Após
sensibilizado, o aluno passa pela contestação, na qual a pergunta é
lançada. Daí, na investigação, pesquisa-se como a tradição
filosófica responde a tal pergunta, examinando os filósofos
cronologicamente dentro de seu tema, como na Antologia de Nicola, ou
em ordem aleatória. Na conceituação, o aluno dá seu
veredito sobre o assunto, não devendo ter sua faculdade crítica
coibida, embora possa precisar de orientação.
Assim, a
aula de filosofia torna-se propriamente uma aula que ensina o
pensamento autônomo que pode ser propriamente fundamentado. Mas
ainda há um outro problema que deve ser sanado: o método, por si
próprio, não ensina a diferenciar pensamento sério e opinião ao
passo que o aluno não necessariamente será capaz de abstrair um
método filosófico de suas leituras. A leitura do texto filosófico
e a identificação do pensamento sério devem ser ensinadas em
lições dentro do método. Resolver esse problema permitiria que
essa evolução do método temático superasse o estruturalismo e
mesmo a necessidade de livros didáticos, pois se usaria o texto
filosófico em seu estado puro nas lições.
Mas o
sucesso ou falha deste método reside também na habilidade do
professor. Ele deve atender todas as habilidades e competências
dispostas nos manuais governamentais (os Parâmetros e a Escola
Aprendente), além de ser capaz de escolher os temas certos para
tocar os alunos. A sensibilização pode simplesmente falhar,
deixando o resto do método infértil. Então, boa parte da
responsabilidade recai sobre o professor, novamente, como no método
temático comum, enquanto que, no estruturalismo, a facilidade de
aplicação não exige um professor muito hábil.
Fluviul Li, Shanghai, China Foto Iuri Pustovoi. |
Conclusão.
O modo de
ensinar filosofia corretamente parece escapar à escola sempre que
encontra uma oportunidade, quase como se a filosofia não pudesse ser
ensinada em seus liames. Mas, mesmo que não fosse, é preciso
acreditar que seja; nem todos seguem a carreira acadêmica em suas
vidas, mas a maioria das pessoas passa pela escola e, se a filosofia
é algo que deveria ser ministrado à população, é necessário que
se ensine filosofia na escola.
A filosofia
tem um caráter formativo enorme, é a peça que falta na educação
do brasileiro comum, que é capaz de ter sua profissão, mas não é
capaz ainda de se comportar como um ser plenamente humano. Se esse
conhecimento não puder ser passado às novas gerações, a tendência
é a redução do ser humano a um estado cada vez mais próximo ao de
animal ou ferramenta.
Embora a
questão sobre o método permaneça em aberto, a pesquisa sobre o
melhor método continua e parece dar frutos úteis. Qualquer coisa
que auxilie o professor de filosofia na sua tarefa de formar pessoas
para que elas não precisem de conserto no futuro é bem-vinda.
Referências bibliográficas.
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se ensina filosofia, mas a filosofar.”
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Cláudio e SOARES, Leandro. Estratégias
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Idade Moderna. Tradução de Maria Margherita de Luca. São
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Disponível em:
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Acessado em: 05/07/14.
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1
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Acesso em: 5 jul. 2014.
2
HISTÓRIA DA FILOSOFIA NO BRASIL. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia
livre. Flórida: Wikimedia Foundation, 2014. Disponível em:
<http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Hist%C3%B3ria_da_filosofia_no_Brasil&oldid=38582931>.
Acesso em: 5 jul. 2014.
3
HISTÓRIA DA FILOSOFIA NO BRASIL. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia
livre. Flórida: Wikimedia Foundation, 2014. Disponível em:
<http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Hist%C3%B3ria_da_filosofia_no_Brasil&oldid=38582931>.
Acesso em: 5 jul. 2014.
4Página
3.
5PIMENTA.
Página 1.
6PIMENTA.
Página 2.
7PIMENTA.
Página 2.
8PIMENTA.
Páginas 7 e 8.
9
BORGES, Donaldo de Assis. “Não se ensina filosofia, mas a
filosofar.” Disponível em:
<http://meuartigo.brasilescola.com/filosofia/nao-se-ensina-filosofia-mas-filosofar.htm>.
Acessado em: 09/07/14.
10
MORTON, Adam. Ensinar a filosofar. Disponível em:
<http://criticanarede.com/filos_filosofar.html>.
Acessado em: 10/07/14.
11
BORGES, Donaldo de Assis. “Não se ensina filosofia, mas a
filosofar.” Disponível em:
<http://meuartigo.brasilescola.com/filosofia/nao-se-ensina-filosofia-mas-filosofar.htm>.
Acessado em: 09/07/14.
12NICOLA,
página 10.
13LOUREIRO
e SOARES, página 2.
Para
citar este documento (ABNT/NBR 6023: 2002):
Almeida, Yure Cézar de Moura: A
Melhor Forma de Ensinar Filosofia? Ainda outra introdução ao método
de Silvio Gallo. Praxis Jurídica, Ano III, N.º 03, 09.05.2016 (ISSN
2359-3059). Disponível em: <http://praxis-juridica.blogspot.com.br/2016/05/a-melhor-forma-de-ensinar-filosofia.html>. Acesso em: .
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