Fonte: Internet. |
Fúlvio Oliveira Paiva
(Graduado em Direito pela Universidade Federal do Ceará)
Emenda Constitucional nº 45, Competência,
Justiça do Trabalho, Relação de Trabalho, Estatutário, Greve,
Dano Moral ou Patrimonial,
RESUMO: o presente trabalho visa a analisar a alteração da
competência da Justiça do Trabalho em decorrência da emenda
constitucional nº 45/2004, bem como trazer e explorar temas
importantes advindos dessa alteração, com a exposição dos incisos
do art. 114 da Constituição Federal de 1988, bem como o estudo de
alguns desses incisos, enfocando o entendimento doutrinário e
jurisprudencial.
Palavras-chave: Emenda Constitucional nº 45, Competência,
Justiça do Trabalho, Relação de Trabalho, Estatutário, Greve,
Dano Moral ou Patrimonial.
THE COMPETENCE OF THE LABOR COURTS AND THE CONSTITUTIONAL
AMENDMENT Nº 45/2004
ABSTRACT: The
present study aims to analyze the change of
jurisdiction of the labor courts as a result of Constitutional
Amendment nº. 45/2004, as well as bring and explore important issues
arising from this change, with the exhibition of the art. 114 of the
Brazil Constitution, and the study of some of these items, focusing
on the doctrinal and jurisprudential understanding.
Keywords: working
relationship, statutory, strike, moral or material damage.
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho trata do impacto causado pela Emenda
Constitucional nº 45 de 2004, mais precisamente quanto às mudanças
na competência da Justiça do Trabalho advindas como novidades
trazidas por essa emenda; além disso, estudo sobre o princípio da
legalidade tributária, com viés à análise da
inconstitucionalidade da cobrança de taxa de emissão de passaporte
comum para brasileiros.
O presente trabalho visa a analisar a alteração da competência da
Justiça do Trabalho em decorrência da emenda constitucional nº
45/2004, bem como trazer e explorar temas importantes advindos dessa
alteração, com a exposição dos incisos do art. 114 da
Constituição Federal de 1988, bem como o estudo de alguns desses
incisos, enfocando o entendimento doutrinário e jurisprudencial.
2 A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45
A EC nº 45/2004, além de várias outras alterações em
dispositivos da Constituição Federal de 1988, resultou em uma
significativa alteração na competência da Justiça do Trabalho, ao
promover a modificação do texto do art. 114, da Lei Maior.
Antes da emenda, a Justiça do Trabalho preocupava-se com os litígios
oriundos da relação de emprego. Após a modificação, a Justiça
Trabalhista passou a abranger não somente a relação de emprego,
mas um campo maior: a relação de trabalho.
Como resultado da alteração, o artigo passou a viger com a seguinte
redação, ipsis litteris:
Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:I as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;II as ações que envolvam exercício do direito de greve;III as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores;IV os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data , quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição;V os conflitos de competência entre órgãos com jurisdição trabalhista, ressalvado o disposto no art. 102, I, o;VI as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho;VII as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho;VIII a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir;§ 1º - Frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros.§ 2º Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente.
Destarte, resta configurada que a mudança foi profunda e com ela,
várias dúvidas surgiram, algumas das quais serão tratadas no
presente trabalho.
3 RELAÇÃO DE EMPREGO X RELAÇÃO DE TRABALHO.
Com a nova leitura do art. 114, a Justiça do trabalho passou a ser
competente para processar e julgar (I) “as ações oriundas da
relação de trabalho [...]”.
A relação de trabalho representa uma expressão mais abrangente do
que relação de emprego. Esta está contida naquela e possui
características específicas que configuram a relação de emprego.
Para que possa se falar em relação de emprego, faz-se necessária a
presença dos seguintes elementos:
Trabalho por pessoa física: o empregado deve ser pessoa física.
Pessoalidade: o contrato de emprego é intuitu personae1,
isto é, celebrado em atenção às qualidades pessoais de um dos
contratantes, qual seja, o empregado de maneira que este deve
prestar, pessoalmente, os seus serviços.
Habitualidade: a mão de obra do empregado deve corresponder a uma
atividade permanente em relação ao empreendimento do empregador2.
Onerosidade: o empregado, em virtude da prestação de seus serviços,
faz jus ao recebimento de uma contraprestação, a remuneração.
Subordinação jurídica: o empregado é subordinado juridicamente ao
empregador, em virtude da existência de um contrato de emprego.
Logo, não se exige a subordinação econômica, ou técnica, mas,
tão-somente, a jurídica.
E, por fim, a alteridade: diz respeito ao fato de que os riscos da
atividade devem ser suportados pelo empregador, não podendo ser
repassados ao empregado.
Esses elementos que caracterizam a relação de emprego estão
dispostos nos arts. 2º e 3º, da Consolidação das Leis do
Trabalho.
Desta forma, a Justiça laboral passou a ser competente para
processar e julgar as ações oriundas da relação de trabalho, que,
como observado, representam um universo mais amplo e que inclui os
litígios provenientes da relação de emprego.
Ilustração de Edgar Mendoza Mancillas. |
4 OS TRABALHADORES ESTATUTÁRIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
O inciso I, do art. 114, dispõe que a competência da Justiça do
Trabalho, com relação às ações oriundas da relação de
trabalho, abrange os entes de direito público externo e os entes da
administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios.
Em virtude dessa redação, surgiu o questionamento no sentido de
saber se a competência da Justiça do Trabalho alcançaria os
litígios envolvendo a Administração Pública e seus servidores
estatutários.
Inicialmente, é mister verificar os agentes da Administração
Pública.
Os agentes temporários são os que prestam serviços em caráter
temporário e de excepcional interesse público. São regidos por um
regime jurídico de direito administrativo. Não há um contrato de
trabalho que o vincule ao Poder Público; há um contrato
administrativo.
Os empregados públicos (celetistas) são aqueles que exercem uma
atividade permanente em relação à Administração Pública. São
sujeitos a um regime jurídico contratual trabalhista. Seu vínculo
com a Administração decorre de um contrato de trabalho.
Os servidores públicos (estatutários) são titulares de cargos
públicos que também exercem uma atividade permanente ao Poder
Público, mas o seu vínculo com a Administração Pública decorre
da lei, sendo, portanto, sujeitos a um regime
jurídico-administrativo.
A matéria foi discutida no Supremo Tribunal Federal, em sede de Ação
Direta de Inconstitucionalidade nº 3395, e o STF concedeu liminar
com efeitos ex tunc, dando interpretação conforme a
Constituição do inciso I, para suspender qualquer interpretação
dada a esse inciso no sentido de incluir, na competência da Justiça
do Trabalho, a “[...] apreciação [...] de causas que [...] sejam
instauradas entre o Poder Público e seus servidores, a ele
vinculados por típica relação de ordem estatutária ou de caráter
jurídico-administrativo.”3
Sendo assim, com essa liminar concedida pela Corte Suprema, a Justiça
do Trabalho só tem competência para julgar as ações envolvendo o
Poder Público e seus agentes celetistas (empregados públicos), uma
vez que estes possuem um vínculo decorrente de um contrato de
emprego com a Administração Pública.
Os servidores estatutários, bem como os demais agentes públicos com
regime jurídico-administrativo, v.g. os agentes temporários, estão
fora da competência da Justiça do Trabalho.
5 DIREITO DE GREVE
O direito de greve, de natureza social, encontra espeque na liberdade
de trabalho e representa uma cessação temporária e voluntária das
atividades do trabalhador, visando a obter reivindicações e
benefícios pleiteados pela categoria, ou para protestar contra algo.
Pela nova redação, o art. 114, no seu inciso II, traz que compete à
Justiça do Trabalho processar e julgar as ações que envolvam o
direito de greve.
Acerca desse tema, deve ser ressaltada a súmula vinculante nº 23,
segundo a qual “A Justiça do Trabalho é competente para processar
e julgar ação possessória ajuizada em decorrência do exercício
do direito de greve pelos trabalhadores da iniciativa privada.”
Assim, as ações possessórias, quais sejam, manutenção de posse,
reintegração de posse e interdito proibitório, que envolvam o
exercício do direito de greve são, a partir da emenda
constitucional nº 45, da competência da Justiça Trabalhista.
6 INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL OU PATRIMONIAL, DECORRENTES DA
RELAÇÃO DE TRABALHO
O inciso VI, do art. 114, CF, trata do das ações de indenização
por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho.
Segundo Carlos Roberto Gonçalves4,
material (ou patrimonial)
é o dano que afeta somente o patrimônio do ofendido. Moral é o que só ofende o devedor como ser humano, não lhe atingindo o patrimônio. Acerca de dano moral, prossegue o autor aduzindo que a expressão “dano moral” deve ser reservada exclusivamente para designar a lesão que não produz qualquer efeito patrimonial.
Pontes de Miranda abre o seu estudo sobre o dano moral fixando um
conceito básico, in Tratado de Direito Privado, Borsói, T. LIII, §§
5.509 e 5. 510, T. XXVI. § 3. 108, esclarecendo que "nos danos
morais, a esfera ética da pessoa é que é ofendida; sendo atingido
o ser humano".
Quanto ao inciso VI, do art. 114, que trata do tema dano moral ou
patrimonial, duas súmulas merecem ser analisadas. São elas: a
súmula vinculante nº 22 e a súmula do STJ nº 367.
Pela redação da súmula vinculante nº 22, tem-se que:
Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente de trabalho propostas por empregado contra o empregador, inclusive aquelas nas quais, ao tempo da edição da Emenda Constitucional nº45/04, ainda não havia sido proferida sentença de mérito em primeiro grau.
Dessa maneira, as ações de indenização por dano moral ou
patrimonial de empregado em face do empregador que não tenham
sentença de mérito na Justiça Comum deslocam-se para a Justiça do
Trabalho.
Logo, somente as ações que já possuam sentença de mérito não
serão remetidas para a Justiça laboral.
O mesmo se extrai da leitura da súmula nº 367, do STJ, cuja redação
diz que
A competência estabelecida pela EC n. 45/2004 não alcança os processos já sentenciados.
7 CONCLUSÃO
Percebe-se, assim, o grande impacto gerado pela Emenda Constitucional
nº 45/2004 no nosso ordenamento jurídico, gerando uma profunda
modificação na competência da Justiça do Trabalho,
8 REFERÊNCIAS
CASSAR, Vólia Bomfim. Direito
do Trabalho. 5. ed.
Niterói: editora Impetus, 2011.
GONÇALVES, Carlos Roberto.
Direito Civil
Brasileiro. 5. ed.
São Paulo: editora Saraiva, 2008 , vol. III
GONÇALVES, Carlos Roberto.
Responsabilidade
Civil. 14. ed. São
Paulo: editora Saraiva, 2012.
PAULO, Vicente &
ALEXANDRINO, Marcelo. Direito
Administrativo Descomplicado.
18. ed. São Paulo: editora Método, 2010.
SARAIVA, Renato. Direito
do Trabalho. 13.
ed. São Paulo: editora Método, 2011.
1
GONÇALVES, Carlos
Roberto. Direito Civil Brasileiro. 9. ed. São Paulo: editora
Saraiva, 2012 , vol. 3, p. 95.
3
EM
27/01/05 "(...) A NÃO INCLUSÃO DO ENUNCIADO ACRESCIDO PELO SF
EM NADA ALTERA A PROPOSIÇÃO JURÍDICA CONSTIDA NA REGRA. (...) NÃO
HÁ QUE SE ENTENDER QUE A JUSTIÇA TRABALHISTA, A PARTIR DO TEXTO
PROMULGADO, POSSA ANALISAR QUESTÕES RELATIVAS AOS SERVIDORES
PÚBLICOS. ESSAS DEMANDAS VINCULADAS A QUESTÕES FUNCIONAIS A ELES
PERTINENTES, REGIDOS QUE SÃO PELA LEI 8112/90 E PELO DIREITO
ADMINISTRATIVO, SÃO DIVERSAS DOS CONTRATOS DE TRABALHO REGIDOS PELA
CLT. (...) EM FACE DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA
RAZOABILIDADE E AUSÊNCIA DE PREJUÍZO, CONCEDO A LIMINAR, COM
EFEITO 'EX TUNC'. DOU INTERPRETAÇÃO CONFORME AO INC. I DO ART. 114
DA CF, NA REDAÇÃO DA EC Nº 45/04. SUSPENDO, AD REFERENDUM , TODA
E QUALQUER INTERPRETAÇÃO DADA AO INC. I DO ART. 114 DA CF, NA
REDAÇÃO DADA PELA EC 45/04, QUE INCLUA, NA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA
DO TRABALHO, A "...APRECIAÇÃO ... DE CAUSAS QUE... SEJAM
INSTAURADAS ENTRE O PODER PÚBLICO E SEUS SERVIDORES, A ELE
VINCULADOS POR TÍPICA RELAÇÃO DE ORDEM." (ADI nº 3395,
relator: Ministro Teori Zavascki).
4
GONÇALVES, Carlos
Roberto. Responsabilidade Civil. 14. ed. São Paulo: editora
Saraiva, 2012, p. 561.
Para citar este
documento (ABNT/NBR 6023: 2002):
Oliveira Paiva,
Fúlvio: A Competência da Justiça do Trabalho e a Emenda Constitucional N.º 45/2004.
Práxis Jurídica, Ano IV, N.º 01, 05.03.2017 (ISSN 2359-3059).
Disponível em: <http://praxis-juridica.blogspot.com.br/2017/06/a-competencia-da-justica-do-trabalho-e.html>. Acesso em:
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