Diogenes. Jean-Léon Gérôme, 1860 |
Razão universal versus razão regional até local
- filosofando numa metafísica infundada
Acelino Pontes
ex-Max Planck-Institut für
Hirnforschung, Köln.
Estudos do Direito, Filosofia,
Física, Matemática, Medicina, Psicologia e Teologia; em Berlin, Fortaleza, Köln
[Colônia], Lisboa
e em München [Munique]
Resumo
O
capítulo III, com o título “Uma
razão que se expressa”
trata da tentativa de fundamentação de uma razão, que venha a
atender aos requisitos de uma razão nacional. Sob
o título “Filosofia
e negação”,
o autor tenta analisar e situar a Filosofia Brasileira no capítulo
IV.
Palavras-Chave:
Razão – Razão Tupiniquim – Crítica – Filosofia da Negação
– Filosofia Brasileira
-
Introdução
O
presente trabalho está restrito a formulação de um resumo dos
capítulos III e IV da obra de Roberto Gomes (Crítica da razão
tupiniquim. 11 ed. São Paulo: FTD, 1994. 120 p.).
Assim
é realizada um análise morfológica e ideológica do capítulo III,
na busca da “razão
que se expressa”,
que venha a atender aos requisitos de uma metafísica universal,
aplicável ao nacional.
Enquanto,
no estudo do capítulo IV, se intenta o estudo sistemático do
conteúdo, que o autor apresenta sob o título de “Filosofia
e negação”,
na esperança de encontrar um fundamento metafísico para a
propositura autoral, que minimamente a justifique.
-
ad “Uma razão que se expressa”
O
capítulo III é inaugurado com uma citação de Mário de Andrade
expressando o caráter subjetivo da originalidade e desenvolve a
questão da razão.
Partindo
da premissa de que a razão ao se expressar “inventa
a Filosofia”,
o autor divaga no esboçar um conceito próprio de razão, que atenda
ao principio da originalidade e da nacionalidade.
De
já, parte para a busca do descobrir-se como um método de encontro
do real externo e o superficial, despidos de artificialidades. Esse
encontro é para GOMES não só a autodescoberta, mas ao mesmo tempo,
um 're-conhecimento'.
Entretanto,
para a “nossa
instalação no real”
perpassamos o questionamento do 'onde
estou?'.
Nesse diapasão, o meu real e a razão, assim, estarão sempre
intimamente ligados ao loco
e
ao tempore,
sem que isso venha influir na 'profundidade'
do inteligível. O autor, aqui, acode-se de Platão e Sócrates, sem
revelar qualquer citação desses filósofos gregos, para fundamentar
o seu postulado.
Da
mesma forma parte para Tomás de Aquino e Hegel
abordando a organização do Estado e o Estado de Direito, sugerindo
que, por Hegel,
“o
Estado é a realização da Razão”.
Supostamente,
configurada a necessidade do loco
et tempore
a título de requisito para uma razão, o autor dá direção ao seu
trabalho no encontro de uma Filosofia Brasileira, que, pretensamente,
possua a qualidade da originalidade. Mas, não sem antes confrontar
os conceitos de verdade, de juízos, de conhecimento com os de
originalidade e o de novidade, quando contata que “o
novo é apenas um acidente do original”,
bem como que
O original, em suma, é o avesso do estranho e do novo: tem aqui e de longa data.
Fugindo
a todo espécime de método convencional na e da Filosofia, GOMES
finda por concluir:
Eis por que uma Filosofia brasileira só terá condições de originalidade e existência quando se descobrir no Brasil. Estar no Brasil para poder ser brasileira. E isto não tem ocorrido. Desde sempre nosso pensar tem sido estranho, providenciado no estrangeiro.
E
finaliza:
A questão se reduz a algo simples: não existe uma "problemática" brasileira à nossa espera. Urge ser inventada. Inventada e posta em questão - este, o esforço da Filosofia, desde sempre. Cabe perguntar se entre-nós encontramos sinais de tal esforço. Em resumo e didaticamente: há uma Filosofia brasileira?
-
ad “Filosofia e negação”
Fonte: Internet. |
Ao
início do capítulo sub analisis, encontramos renovadamente
uma citação de Mário de Andrade:
O
passado é lição para se meditar, não para reproduzir.
Daí
já se toma que o capítulo certamente vai tratar da reprodução de
conhecimento. Mas, resta interessante notar que a primeira frase
indica um suposto 'trágico' da Filosofia por ter que se justificar.
Resta a pergunta ao autor: há algum conhecimento que não necessite
de se justificar, no mínimo apresentar competente fundamentação,
quer metodológica, quer de mérito ou conteúdo?
Dessa
constatação, o texto se envolve com a determinação do lugar, da
validade, da importância e dos resultados da ciência. Mas, no que
toque à Filosofia o autor reafirma a postulada necessidade de
justificabilidade, como uma 'certa atitude geral diante do
Universo'. Ainda acrescenta, que a Filosofia questiona a
existência, momento em que “gera seus próprios objetos”,
até como “ato de intuição”.
Nesse processo, ressalta os elementos “atitude, invenção,
projeção e determinação das urgências”,
que só completa com o exsurgir
… da justificação da atitude filosófica (crítica) ao uso da Filosofia para justificar atitudes (ideologia).
Critica
ainda, a nossa Filosofia que indica infestada de “vícios de
nossa costumeira posição intelectual” ou ainda, “dada
pelo homem sério - erudição, brilho, status, justificação
ideológica vigente - a importância da Filosofia quando levada a
sério - emergência da consciência negadora”.
Aqui
se vislumbra a dimensão do 'sério', do 'erudito', do 'respeitável',
da 'responsabilidade' (como 'essencialmente acrítica'), do
'comprometido com dado sistema', da 'utilidade da Filosofia' (como
'versão séria' da sua importância), do pensar filosófico como
ideologia, tudo isso contemplado como vícios da nossa constituição
como Filosofia Brasileira, a dita tupiniquim.
Em
contrário, GOMES reclama para 'justificar' a Filosofia que
defenderia para a 'brasileira', momentos como o do 'destruir um
mundo', o do 'dizer o contrário', o do dar consistência e
historicidade, o da intuição potencialmente criadora (com a
'cristalização' e a 'esterilidade'), o de uma 'nova intuição
(como renovação da intuição originária) e, por fim, o da
negação.
Na
negação, o autor tenta encontrar corroboração no pensamento de
Platão, Sócrates e dos neoplatônicos, para justificar a imanente
necessidade da negação na construção do pensamento filosófico.
Ainda
assinala o que intitula de 'um momento de devastadora destruição'
como 'máxima criação' supostamente defendido por Oswald de
Andrade, equiparando esses conceitos à necessidade de modernizar
alvitrada pelo italiano Giorgio Vasari e à 'maneira
moderna' de tal forma também italianos Leonardo da Vinci, bem
como de Rafaelo Sanzio de Urbino e,
ainda, à 'língua nova' de Giotto
e Cimabue. Ao que tudo
indica, essas postulações equiparantes são apresentadas na mesma
afinação ao princípio, antes evocado, da negação.
E
conclui:
Há, no entanto, uma condição para este não. A crítica é algo a ser assumido, é uma posição do espírito. E não a assumo do ponto de vista da eternidade. Por um motivo simples: não estou na eternidade. Estou no tempo, num lugar. Ao assumir a postura crítica a partir deste tempo e lugar, deixa de haver distância entre o que digo e o que sou - inexistindo qualquer diferença entre estar e ser. Digo o que sou. Isto é Filosofia. Meu streap-tease cultural.
[…]
Eis por que, não assumindo uma posição nossa, um pensar brasileiro torna-se impossível - impossibilitado de criar por não aceitar destruir o passado que nos impuseram -, recusando assumir sua condição básica: que seja nosso, negador do alheio.
-
Conclusão
A
obra abalizada, nos capítulos apreciados, defende a propriedade do
loco e do tempore para validação da razão e do
filosofar, na tentativa de justificar a existência de uma razão e
filosofia regional e temporal, ao exemplo de uma razão brasileira.
No
ensaio de erigir essa filosofia, GOMES imprime o fenômeno da negação
como fundamento, ao mesmo tempo, que a essa estampa determinadas
configurações e requisitos essenciais, tudo isso desposado de
qualquer fundamentação lógico-formal, que realize as exigências filosófico-metafísicas para a respectiva validação.
Decididamente,
o autor não apresenta qualquer fundamento metafísico ou minimamente
inteligível, que venha a fundamentar qualquer de suas postulações.
Talvez,
não tenha se apercebido o autor de que o conhecimento filosófico,
para garantir sua validade, perpassa a qualidade do universal. Nessa
configuração é possível construir uma razão regional ou até
temporal, mas tão somente a partir do universal. Qualquer
iniciativa, de per si, a inaugurar uma razão regional e/ou
temporal estará sempre espavorida pelo tormento do utilitarismo e da
perda da universalidade.
Referências
Bibliográficas
GOMES,
Roberto: Crítica
da razão tupiniquim.
11 ed. São Paulo: FTD, 1994. 120 p.
Para
citar
este
documento:
PONTES,
Acelino: ratio universalis versus ratio regionalis usque localis
[Razão universal versus razão regional até local] - filosofando
numa metafísica infundada. Comunicação apresentada na XI Semana de
Filosofia da UECE. Praxis
Jurídica, Ano III, N.º 01, 09.02.2016 (ISSN 2359-3059). Disponível
em: <http://praxis-juridica.blogspot.com.br/2016/02/ratio-universalis-versus-ratio.html>. Acesso em: .
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