terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

ratio universalis versus ratio regionalis usque localis

Diogenes. Jean-Léon Gérôme, 1860

Razão universal versus razão regional até local

- filosofando numa metafísica infundada




Acelino Pontes

ex-Max Planck-Institut für Hirnforschung, Köln.
 Estudos do Direito, Filosofia, Física, Matemática, Medicina, Psicologia e Teologia; em Berlin, Fortaleza, Köln [Colônia], Lisboa 
e em München [Munique]



Resumo

O capítulo III, com o título “Uma razão que se expressa” trata da tentativa de fundamentação de uma razão, que venha a atender aos requisitos de uma razão nacional. Sob o título “Filosofia e negação”, o autor tenta analisar e situar a Filosofia Brasileira no capítulo IV.


Palavras-Chave: Razão – Razão Tupiniquim – Crítica – Filosofia da Negação – Filosofia Brasileira


  1. Introdução


O presente trabalho está restrito a formulação de um resumo dos capítulos III e IV da obra de Roberto Gomes (Crítica da razão tupiniquim. 11 ed. São Paulo: FTD, 1994. 120 p.).
Assim é realizada um análise morfológica e ideológica do capítulo III, na busca da “razão que se expressa”, que venha a atender aos requisitos de uma metafísica universal, aplicável ao nacional.
Enquanto, no estudo do capítulo IV, se intenta o estudo sistemático do conteúdo, que o autor apresenta sob o título de “Filosofia e negação”, na esperança de encontrar um fundamento metafísico para a propositura autoral, que minimamente a justifique.

  1. ad “Uma razão que se expressa”


O capítulo III é inaugurado com uma citação de Mário de Andrade expressando o caráter subjetivo da originalidade e desenvolve a questão da razão.
Partindo da premissa de que a razão ao se expressar “inventa a Filosofia”, o autor divaga no esboçar um conceito próprio de razão, que atenda ao principio da originalidade e da nacionalidade.
De já, parte para a busca do descobrir-se como um método de encontro do real externo e o superficial, despidos de artificialidades. Esse encontro é para GOMES não só a autodescoberta, mas ao mesmo tempo, um 're-conhecimento'.
Entretanto, para a “nossa instalação no real” perpassamos o questionamento do 'onde estou?'. Nesse diapasão, o meu real e a razão, assim, estarão sempre intimamente ligados ao loco e ao tempore, sem que isso venha influir na 'profundidade' do inteligível. O autor, aqui, acode-se de Platão e Sócrates, sem revelar qualquer citação desses filósofos gregos, para fundamentar o seu postulado.
Da mesma forma parte para Tomás de Aquino e Hegel abordando a organização do Estado e o Estado de Direito, sugerindo que, por Hegel, “o Estado é a realização da Razão”.
Supostamente, configurada a necessidade do loco et tempore a título de requisito para uma razão, o autor dá direção ao seu trabalho no encontro de uma Filosofia Brasileira, que, pretensamente, possua a qualidade da originalidade. Mas, não sem antes confrontar os conceitos de verdade, de juízos, de conhecimento com os de originalidade e o de novidade, quando contata que “o novo é apenas um acidente do original”, bem como que
O original, em suma, é o avesso do estranho e do novo: tem aqui e de longa data.
Fugindo a todo espécime de método convencional na e da Filosofia, GOMES finda por concluir:
Eis por que uma Filosofia brasileira só terá condições de originalidade e existência quando se descobrir no Brasil. Estar no Brasil para poder ser brasileira. E isto não tem ocorrido. Desde sempre nosso pensar tem sido estranho, providenciado no estrangeiro.
E finaliza:
A questão se reduz a algo simples: não existe uma "problemática" brasileira à nossa espera. Urge ser inventada. Inventada e posta em questão - este, o esforço da Filosofia, desde sempre. Cabe perguntar se entre-nós encontramos sinais de tal esforço. Em resumo e didaticamente: há uma Filosofia brasileira?


  1. ad “Filosofia e negação”
Fonte: Internet.


Ao início do capítulo sub analisis, encontramos renovadamente uma citação de Mário de Andrade:
O passado é lição para se meditar, não para reproduzir.
Daí já se toma que o capítulo certamente vai tratar da reprodução de conhecimento. Mas, resta interessante notar que a primeira frase indica um suposto 'trágico' da Filosofia por ter que se justificar. Resta a pergunta ao autor: há algum conhecimento que não necessite de se justificar, no mínimo apresentar competente fundamentação, quer metodológica, quer de mérito ou conteúdo?
Dessa constatação, o texto se envolve com a determinação do lugar, da validade, da importância e dos resultados da ciência. Mas, no que toque à Filosofia o autor reafirma a postulada necessidade de justificabilidade, como uma 'certa atitude geral diante do Universo'. Ainda acrescenta, que a Filosofia questiona a existência, momento em que “gera seus próprios objetos”, até como “ato de intuição”. Nesse processo, ressalta os elementos “atitude, invenção, projeção e determinação das urgências”, que só completa com o exsurgir
da justificação da atitude filosófica (crítica) ao uso da Filosofia para justificar atitudes (ideologia).
Critica ainda, a nossa Filosofia que indica infestada de “vícios de nossa costumeira posição intelectual” ou ainda, “dada pelo homem sério - erudição, brilho, status, justificação ideológica vigente - a importância da Filosofia quando levada a sério - emergência da consciência negadora”.
Aqui se vislumbra a dimensão do 'sério', do 'erudito', do 'respeitável', da 'responsabilidade' (como 'essencialmente acrítica'), do 'comprometido com dado sistema', da 'utilidade da Filosofia' (como 'versão séria' da sua importância), do pensar filosófico como ideologia, tudo isso contemplado como vícios da nossa constituição como Filosofia Brasileira, a dita tupiniquim.
Em contrário, GOMES reclama para 'justificar' a Filosofia que defenderia para a 'brasileira', momentos como o do 'destruir um mundo', o do 'dizer o contrário', o do dar consistência e historicidade, o da intuição potencialmente criadora (com a 'cristalização' e a 'esterilidade'), o de uma 'nova intuição (como renovação da intuição originária) e, por fim, o da negação.
Na negação, o autor tenta encontrar corroboração no pensamento de Platão, Sócrates e dos neoplatônicos, para justificar a imanente necessidade da negação na construção do pensamento filosófico.
Ainda assinala o que intitula de 'um momento de devastadora destruição' como 'máxima criação' supostamente defendido por Oswald de Andrade, equiparando esses conceitos à necessidade de modernizar alvitrada pelo italiano Giorgio Vasari e à 'maneira moderna' de tal forma também italianos Leonardo da Vinci, bem como de Rafaelo Sanzio de Urbino e, ainda, à 'língua nova' de Giotto e Cimabue. Ao que tudo indica, essas postulações equiparantes são apresentadas na mesma afinação ao princípio, antes evocado, da negação.
E conclui:
Há, no entanto, uma condição para este não. A crítica é algo a ser assumido, é uma posição do espírito. E não a assumo do ponto de vista da eternidade. Por um motivo simples: não estou na eternidade. Estou no tempo, num lugar. Ao assumir a postura crítica a partir deste tempo e lugar, deixa de haver distância entre o que digo e o que sou - inexistindo qualquer diferença entre estar e ser. Digo o que sou. Isto é Filosofia. Meu streap-tease cultural.
[…]

Eis por que, não assumindo uma posição nossa, um pensar brasileiro torna-se impossível - impossibilitado de criar por não aceitar destruir o passado que nos impuseram -, recusando assumir sua condição básica: que seja nosso, negador do alheio.


  1. Conclusão


A obra abalizada, nos capítulos apreciados, defende a propriedade do loco e do tempore para validação da razão e do filosofar, na tentativa de justificar a existência de uma razão e filosofia regional e temporal, ao exemplo de uma razão brasileira.
No ensaio de erigir essa filosofia, GOMES imprime o fenômeno da negação como fundamento, ao mesmo tempo, que a essa estampa determinadas configurações e requisitos essenciais, tudo isso desposado de qualquer fundamentação lógico-formal, que realize as exigências filosófico-metafísicas para a respectiva validação.
Decididamente, o autor não apresenta qualquer fundamento metafísico ou minimamente inteligível, que venha a fundamentar qualquer de suas postulações.
Talvez, não tenha se apercebido o autor de que o conhecimento filosófico, para garantir sua validade, perpassa a qualidade do universal. Nessa configuração é possível construir uma razão regional ou até temporal, mas tão somente a partir do universal. Qualquer iniciativa, de per si, a inaugurar uma razão regional e/ou temporal estará sempre espavorida pelo tormento do utilitarismo e da perda da universalidade.


Referências Bibliográficas


GOMES, Roberto: Crítica da razão tupiniquim. 11 ed. São Paulo: FTD, 1994. 120 p.



Fale com o autor.


Para citar este documento:


PONTES, Acelino: ratio universalis versus ratio regionalis usque localis [Razão universal versus razão regional até local] - filosofando numa metafísica infundada. Comunicação apresentada na XI Semana de Filosofia da UECE. Praxis Jurídica, Ano III, N.º 01, 09.02.2016 (ISSN 2359-3059). Disponível em: <http://praxis-juridica.blogspot.com.br/2016/02/ratio-universalis-versus-ratio.html>. Acesso em: .


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