Jacques Louis David: Les Sabines, 1799. Fonte: Internet. |
Marcio Alexandre Pinheiro Cavalcante
- Objetivo
Ao estudo dos sistemas, que
permeiam e viabilizam todo o processo de aplicação do conceito
Direito Natural, se procura encontrar acosto acadêmico para
justificar e possibilitar o entendimento spinoziana na espécie.
Por fim, a título de objetivo
específico, se faz inevitável um estudo pontual de situações e
caracterizações de elementos, que se possa aplicar na situação e
sua problemática.
-
Metodologia
Na presente pesquisa utiliza-se
de método qualitativo com abordagem descritiva, interpretativa,
analítica e ordena-se dado por técnicas específicas de consulta da
literatura e de leitura analítica.
Preliminarmente efetua-se o
levantamento, seleção e documentação de toda bibliografia já
publicada sobre o assunto em livros, revistas, monografias,
dissertações e teses que possibilite o contato direto com todo
material já escrito sobre o assunto.
-
Justificativa
A mediação da faculdade de
compreensão sobre a temática direito natural, sociedade
civil e os fundamentos do estado difere em Spinoza
fundamentalmente do entendimento de até então, embora esse se deixe
fortemente influenciar pelo inglês Hobbes [GOMES, 2010, p.
1].
Inicialmente, uma percepção
do que a tradição filosofia nos refere em relação ao direito
natural, à lição de DELEUZE [2009, p. 86-88] (apud SILVA,
2011, p. 99]:
A teoria do direito natural foi a
compilação da maior parte das tradições da antiguidade e o ponto
de confrontação do cristianismo com as tradições da antiguidade.
Para esta concepção clássica do direito natural, há dois nomes
importantes; por um lado, Cícero que compila na antiguidade todas as
tradições, platônica, aristotélica e estóica sobre o assunto.
Ele faz uma espécie de apresentação do direito natural na
antiguidade que vai ter uma extrema importância. É em Cícero que
os filósofos e os juristas cristãos buscam, ou farão esta espécie
de adaptação ao cristianismo do direito natural, notadamente em São
Tomás. Então, teremos uma espécie de linha histórica que eu vou
chamar, por comodidade, a linha do direito natural clássico,
antiguidade-cristianismo. Ora, o que é que eles chamam de direito
natural? Grosso modo eu diria: em toda essa concepção, o que
constitui o direito natural, é o que está conforme à essência. Há
como que várias proposições nesta teoria clássica do direito
natural.
Continuando com DELEUZE [Ibd.]
encontramos a diferenciação da matéria por via axiomática, que
nos traz uma visão metafísica do Direito Natural:
Eu gostaria que vocês retivessem
estas quatro proposições básicas que serão a base do direito
natural clássico. Primeira proposição: uma coisa se define por sua
essência. O direito natural é então o que está conforme a
essência de alguma coisa. A essência do homem é animal racional;
isto define o seu direito natural. Bem mais, ser racional é a lei da
sua natureza. A lei da natureza intervém aqui. Então, referência
às essências. Segunda proposição: a partir de então, o direito
natural não pode enviar – e é muito surpreende então nte que
para a maioria dos autores da antiguidade, o direito natural não
envia –, a um estado que seria suposto preceder à sociedade. O
estado de natureza é o estado conforme a essência em uma boa
sociedade. Chamamos uma boa sociedade a uma sociedade na qual o homem
pode realizar sua essência. Então, o estado de natureza não é
anterior ao estado social; o estado de possível; isto é, a mais
apta a realizar a essência. Eis a segunda proposição do direito
natural clássico. Terceira proposição: o que é primeiro é o
dever. Temos os direitos somente enquanto temos os deveres. É muito
prático politicamente. Com efeito, o que é o dever? Aqui, há um
conceito de Cícero que é próprio aos latinos, que indica esta
idéia de dever funcional, os “deveres de função”, é o termo
“officium”. E um dos livros mais importantes de Cícero
concernente ao direito natural, é um livro intitulado “De
officiis”, sobre os deveres funcionais. E por que é primeiro o
dever na existência? Porque o dever é precisamente a condição sob
as quais eu posso melhor realizar a essência; isto é, ter uma vida
conforme a essência, na melhor sociedade possível. Quarta
proposição: resulta em uma regra prática que terá uma grande
importância política. Poderíamos resumi-la sob o título: a
competência do sábio. O que é o sábio? É alguém que é
singularmente competente nas buscas que concernem à essência, e
tudo o que disto decorre. O sábio é aquele que sabe o que é a
essência. Então há um princípio de competência do sábio porque
é o sábio que nos diz qual é a nossa essência, qual é a melhor
sociedade, isto é, a sociedade mais apta a realizar a essência; e
quais são nossos deveres funcionais, nossos “officia”, isto é,
sob quais condições nós podemos realizar a essência. Tudo isto é
da competência do sábio. E a questão: o que pretende o sábio
clássico? É necessário responder que o sábio clássico pretende
determinar qual é a essência; e a partir de então, derivar daí
todo tipo de tarefas práticas. Daí a pretensão política do sábio.
Então, se resume esta concepção clássica do direito natural, de
pronto vocês compreendem porque o cristianismo estará muito
interessado por esta concepção antiga do direito natural.
Fonte: Internet. |
Mas, em Spinoza,
o conceito de direito natural se vincula à existência de Deus,
enquanto uma potência eterna e infinita, qual seja a substância
absolutamente infinita que a tudo determina. Daí, se reflete uma
concepção de direito natural na qualidade jus sive potentia,
como bem explica RIBEIRO [2010, p. 52]:
Poder-se-ia
dizer que a concepção spinozana do direito natural se resume na
expressão jus sive potentia,
uma vez que é direito natural de qualquer um – ou mesmo de
qualquer coisa, uma vez que a argumentação spinozana é aplicável
a qualquer modo, não apenas ao homem – fazer tudo aquilo que
efetivamente faz.
Ainda se toma de Spinoza
a assertiva de que “por direito e instituição natural entendo
unicamente as regras da natureza de cada indivíduo, regras segundo
as quais concebemos qualquer ser como naturalmente determinado a
existir e a agir de uma certa maneira” [ESPINOSA, 2003, p. 234]
Nessa configuração, Spinoza
expressa uma coincidência nos conceitos de direito, poder e
potência, contrapondo-se à visão contratualista de Hobbes e
de Rousseau, expressando a Supremacia do direito natural em
fase a ordem moral–jurídica.
Interessante ressaltar, a
partir de RIBEIRO [2010, p. 70], que em Spinoza a democracia
não seria obrigatoriamente o melhor regime, pelo contrário, se
apresenta como um contrassenso, ligando a singularidade dos povos à
singularidade dos homens.
Em última análise, se são boas as
instituições, não é sobre o medo infundido, por exemplo, pela
coerção que repousa a obediência às leis do Estado ou sobre o
fato de que o governo não causa indignação. Esse mecanismo é
apenas subsidiário. É principalmente da participação da multitude
no exercício do poder e da utilidade das leis da cidade que acaba
por derivar a obediência.
[...]
Numa construção única na história
da filosofia, a democracia spinozana emerge assim simultaneamente
como a forma de organização espontânea da sociedade, por um
processo puramente afetivo, como o regime inteiramente absoluto e
como o critério ou parâmetro de perfeição dos demais regimes.
Dessa formação espontânea,
pode surgir a falsa impressão de que o caos possa se instalar no
Estado civil. Mas, isso não ocorre, como ROCHA [2011, p 91-92] assim
conclui:
De acordo com nossa pesquisa,
afirmamos com Spinoza que cada um existe em virtude do direito
supremo da natureza e, conseqüentemente, é em virtude deste, que
cada um faz o que segue a necessidade de sua natureza. Quando
qualquer um julga o que lhe é bom ou mau, atendendo a utilidade que
melhor lhe convém, quando este se vinga ou se esforça para
conservar o que ama e destruir aquilo que tem ódio, faz em virtude
do supremo direito da natureza. Contudo, os homens não vivem só sob
a direção da razão, mas estão naturalmente sujeitos às paixões
e, por isso são inconstantes, mutáveis e muitas vezes arrastados em
sentido contrário.
O homem, segundo Spinoza,
é dotado de direito quanto de poder sobre a natureza, quem podem
sofrer multiplicação se “duas pessoas concordam entre si e
unem as suas forças, terão mais poder conjuntamente e,
consequentemente, um direito superior sobre a Natureza que cada uma
delas não possui sozinha e, quanto mais numerosos forem os homens
que tenham posto suas forças em comum, mais direito terão eles
todos” [ESPINOSA, 1983, p. 310].
Essa extensão de direito e de
poder, se justifica pelo fato de que “todos os homens temem a
solidão, porque nenhum deles na solidão tem força para se defender
e obter as coisas necessárias à vida, daí resulta que os homens
têm, do estado civil, um desejo natural e que não pode dar-se que
tal estado seja nunca inteiramente dissolvido” [ESPINOSA, 1983,
p. 321].
Spinoza. Fonte: Internet. |
A despeito de tudo o que já se
tinha pensado antes (Hobbes) ou após (Kant) Spinoza,
que funda a organização do Estado e da sociedade civil a partir da
razão e do contrato social, a filosofia spinosiana se fundamenta no
conatus, na prevalência do direito natural, no princípio da
causalidade eficiente e imanente, no princípio da imitação dos
afetos. Nisso ele insere o postulado ontológico da sociedade civil,
segundo o qual o “surgimento da sociedade civil não se dá sob
a ação de causas finais” [RIBEIRO, 2010, p. 70].
Da lavra do próprio Spinoza,
no bojo de carta escrita a Jarig Jelles, datada em 2 de junho
de 1674, se toma a expressão de sua diferenciação:
Tu me perguntas qual é a diferença
entre a concepção política de Hobbes e a minha. Respondo-te: a
diferença consiste em que mantenho sempre o direito natural e que
considero que o magistrado supremo, em qualquer cidade, só tem
direitos sobre os súditos na medida em que seu poder seja superior
ao deles; coisa que sempre ocorre no estado natural. [ESPINOSA, 1983,
p. 390]
Entretanto, não se pode
entender a imposição do direito natural sobre o Estado civil
reclamada por Spinoza, se antes não pressentir o conceito
espinoziano do homem, segundo o qual as paixões e emoções são
elementos próprios da natureza humana aos quais os homens estão
submetidos [ESPINOSA, 1983, p. 210-221; 225-272]. Nessa dependência,
cada qual deseja que os outros vivam
consoante a sua própria compleição, aprovem o que ele próprio
aprova, e rejeitem o que ele próprio rejeita. Donde resulta que,
querendo todos ser os primeiros, surjam conflitos entre eles,
procurem esmagar-se uns aos outros e que o vencedor se glorifique
mais por ter triunfado do seu rival que por haver obtido qualquer
vantagem para si mesmo. [ESPINOSA, 1983, p. 306]
-
Objetivo
Ao estudo dos sistemas, que
permeiam e viabilizam todo o processo de aplicação do conceito
Direito Natural, se procura encontrar acosto acadêmico para
justificar e possibilitar o entendimento spinoziana na espécie.
Por fim, a título de objetivo
específico, se faz inevitável um estudo pontual de situações e
caracterizações de elementos, que se possa aplicar na situação e
sua problemática.
-
Metodologia
Na presente pesquisa utiliza-se
de método qualitativo com abordagem descritiva, interpretativa,
analítica e ordena-se dado por técnicas específicas de consulta da
literatura e de leitura analítica.
Preliminarmente efetua-se o
levantamento, seleção e documentação de toda bibliografia já
publicada sobre o assunto em livros, revistas, monografias,
dissertações e teses que possibilite o contato direto com todo
material já escrito sobre o assunto.
Referências
Bibliográficas
ABBAGNANO,
Nicola. Dicionário
de Filosofia.
Tradução da 1ª edição brasileira coordenada e revisada por
Alfredo Bosi; revisão da tradução e tradução dos novos textos
Ivone Castilho Benedetti – 4ª ed. – São Paulo: Martins Fontes,
2000.
AQUINO,
Jefferson Alves de. Direito
e poder em Espinosa - Os fundamentos da
liberdade
política.
Kalagatos - Revista de Filosofia do Mestrado Acadêmico em
Filosofia
da UECE, v.2, n.4, (2005), p. 109-135.
BARNES,
J. (org.). Filósofos
pré-socráticos.
2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997. 367 p.
BOBBIO,
N., BOVERO, M. Sociedade
e Estado na Filosofia Política Moderna.
São Paulo: Editora Brasiliense, 1986.
CHAGAS,
José Soares das. O
ético e o hermenêutico sob o viés imanentista de Spinoza.
Dissertação (Mestrado Acadêmico em Filosofia). Universidade
Estadual do Ceará, Centro de Humanidades Fortaleza, 2011. 155 p.
CHAUÍ,
Marilena. A nervura
do real: liberdade e imanência em Espinosa.
São Paulo: Companhia das Letras, 1999.
_________________.
Desejo, paixão e
ação na ética de Espinosa.
São Paulo: Companhia das Letras, 2011.
_________________.
Espinosa: uma
filosofia da liberdade.
2ª ed. São Paulo: Moderna, 2005.
_________________.
Política em
Espinosa. São
Paulo: Companhia das Letras, 2003.
COLERUS.
Biografia de
Spinoza. Tradução
Emanuel Angelo da Rocha Fragoso. Disponível em <
http://www.benedictusdespinoza.pro.br/539.html>.
Acesso em: 19/10/2012 14:12.
DELEUZE,
Gilles. Cursos sobre
Spinoza (Vincennes,
1978-1981). Tradução de Emanuel Ângelo da Rocha Fragoso, Francisca
Evilene Barbosa de Castro, Hélio Rebello Cardoso Junior e Jeferson
Alves de Aquino. Fortaleza: EdUECE, 2009.
_________________.
Espinosa - Filosofia
prática. Tradução:
Daniel Lins e Fabien
Pascal
Lins. São Paulo: Escuta, 2002.
ESPINOSA,
B. Correspondência.
Tradução e notas de Marilena de Souza Chauí. 3d. São Paulo: Abril
Cultural, 1983.
_________________.
Ética.
Edição bilíngue Latim-Português. 2 ed. Belo Horizonte: Autêntica
Editora, 2008.
_________________.
Ética,
Tratado político e Correspondência.
3ª ed. São Paulo: Abril Cultural, 1983.
_________________.
Pensamentos
Metafísicos. 2 ed.
Tradução e notas de Marilena de Souza Chauí. São Paulo: Abril
Cultural, 1979. (Os Pensadores).
_________________.
Tratado da correção
do intelecto. 2 ed.
Tradução e notas de Carlos Lopes de Mattos. São Paulo: Abril
Cultural, 1979. (Os Pensadores).
_________________.
Tratado da reforma
do entendimento.
Edição bilíngue. Trad. Abílio Queirós. Prefácio e notas de
Alexandre Koyré. Lisboa: Edições 70, 1969. (Textos filosóficos).
_________________.
Tratado da reforma
da inteligência.
Tradução e notas de Lívio Teixeira. São Paulo: Cia Editora
Nacional.1966. (Biblioteca Universitária).
_________________.
Tratado Político.
Tradução, introdução e notas de Diogo Pires Aurélio. São Paulo:
Martins Fontes, 2009.
_________________.
Tratado
Teológico-Político.
Tradução Diogo Pires Aurélio. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
FRAGOSO,
Emanuel Angelo da Rocha. A
concepção da natureza humana em Benedictus de Spinoza.
in: Cadernos espinosanos, estudos sobre o século XVII. São Paulo,
n. XIX, jul-dez. 2009. p. 83-95.
_________________.
O conceito de
liberdade na Ética de Benedictus de Spinoza.
Revista Conatus – Revista de filosofia- v. 1, n.1 (2007) p.27-36
GOMES,
Débora. A Noção
Hobbesiana de Estado de Natureza e a Teoria Política de Spinoza.
Revista do Seminário dos Alunos do PPGLM/UFRJ: n.2, 2011. Disponível
em <
http://seminarioppglm.files.wordpress.com/2012/03/gomes-d-a-nocao-hobbesiana-de-estado-de-natureza-e-a-teoria-politica-de-spinoza.pdf>.
Acesso em: 19/10/2012 13:45
HOBBES,
T. Do cidadão.
2ª ed., São Paulo, Martins Fontes, 1998. 400 p.
HOBBES,
T. Leviatã.
2ª ed., Lisboa, INCM, 1999. 526 p.
MOREAU,
J. Espinosa e o
espinosismo. São
Paulo: Ed.70, 1982. Col. Biblioteca
básica
de filosofia.
OLIVEIRA,
Manfredo A. de (Org.): Correntes
Fundamentais da Ética Contemporânea.
Petrópolis-RJ: Vozes, 2000. 255 p.
PONTES,
Acelino: Filosofia
Prática na Alemanha - influências de Hermann Keyserling.
Monografia de Graduação em Filosofia (Bacharelado), Centro de
Humanidades - Curso de Filosofia. Fortaleza: Universidade Estadual do
Ceará, 2011. 106 p.
RIBEIRO,
Luís Antônio Cunha. Sociedade,
Política e Direito no Pensamento de Spinoza.
Cadernos da EMARF, Fenomenologia e Direito, Rio de Janeiro, v.3, n.1,
p.1-132, abr./set.2010.
ROCHA,
Claudio de Souza. Os
fundamentos da Democracia em Benedictus de Spinoza.
Dissertação (Mestrado Acadêmico em Filosofia). Universidade
Estadual do Ceará, Centro de Humanidades Fortaleza, 2011.100 p.
SCHMITT,
C. O conceito do
político.
Petrópolis, Vozes, 1992. 151 p.
SILVA,
Elainy Costa da. Conatus: Da
Essência Humana à Fundamentação do Estado na Ética de Benedictus
de Spinoza.
Dissertação (Mestrado Acadêmico em Filosofia). Universidade
Estadual do Ceará, Centro de Humanidades Fortaleza, 2011.130 p.
Para
citar este documento (ABNT/NBR 6023: 2002):
Cavalcante, Marcio Alexandre Pinheiro: Elementos
do Direito Natural em Spinoza. Praxis Jurídica, Ano III, N.º 01,
09.02.2016 (ISSN 2359-3059). Disponível em: <http://praxis-juridica.blogspot.com.br/2016/02/elementos-do-direito-natural-em-spinoza.html>. Acesso em: .
0 comentários:
Postar um comentário