sábado, 5 de novembro de 2016

Sentença: Furto duplamente qualificado com concurso de agentes

Edinburgh Clock Tower, Scotland (Photo by Marco Bocelli).



EMENTA: Delito Patrimonial. Furto du­plamente qualificado. Concurso de Agen­tes. Concurso Formal. Durante o Repouso Noturno. Destrui­ção ou rompi­mento de obstáculo. Depoimento judici­al dos Poli­ciais militares harmôni­co e uníssono no sentido da responsabili­zação cri­minal do réu. Presun­ção da res­ponsabilidade. Condenação. Absolvição. Impossibilida­de. Nos crimes contra o patri­mônio, em regra, praticados na clandestini­dade e sem testemu­nhas presenciais, para justi­ficar a condenação basta a existência de provas que in­diquem, com certeza, a autoria, como no caso, porque o réu não forneceu qual­quer expli­cação plausível para justificar a pre­sença da coi­sa sub­traída em seu poder. Muito embora a ne­gativa da autoria, a absolvição resta inviável se as pro­vas produzi­das, que se revela con­corde e coe­rente com os elementos probatórios, são suficient­es para sustentar a condenação.


Vistos etc.


I - Relatório


No presente feito, disserta-se acerca da ação penal manejada pela Justiça Pública contra F., devidamente qualificado nos autos, por ter sido apontado pela prática dos crimes catalogados nos artigos 155, § 4.º, inciso I e IV, do Código Penal Brasileiro.

Consta que o acusado foi preso em flagrante delito “por infra­ção, em tese, ao art. 180, Código Penal”, figurando como vítima, Paulo Cabral Monteiro, conforme se toma do auto de prisão em flagrante, fls. 6-8.

O caderno policial relata ainda que o Réu, foi

surpreendido logo após ter(em) sido encontrado um gabinete de computador no telhado de sua residência localizada nos fundos do Griforífico (sic) GG situado, na R 13 de Abril, 139, bairro Vila União, Fortaleza, CE, circunscrição da Delegacia do 25. Distrito Policial, […]

A peça inaugural da douta Promotoria exsurge nos autos, às fls. 2 até 4, com data de 08.11.2010 culpabilizando o Réu como incurso nas penas do art. 155, § 4.º, incisos I e IV do CP, recebida em 09.11.2010 (fls. 39) nos termos do art. 180 do CP, e devidamente ratificada em 11.12.2011, pelo despacho de fls. 58, ocasião em que restou aprazada a respectiva audiência de instrução e julgamento para 03.02.2014 às 14:30h.

O respeitável Defensor Público atuante nesta Vara inaugura pedido de relaxamento de prisão às fls. 43-46, de cujo objeto foi apreciado em Despacho ás fls. 47, concedendo a liberdade do Réu.

Empós a competente citação materializa à luz da certidão meiri­nhal (fls. 55), a título de resposta à acusação, o Réu fez-se representar às fls. 56-57, através da Defensoria Pública.

A instrução ocorreu na conformidade o Termo de Audiência de 30.06.2015, que repousa no leito dos fólios às fls. 68, quando foram ouvidas as testemunhas arroladas pelo Ministério Público, os servidores da PM José Lucindo de Oliveira, Francisco Alessandro Maia de Sousa e Luis Cesar da Silva Costa, ao final também inquirido, na ocasião, o réu Francisco Kadu Silva Sales, oitivas essas devidamente documentadas em vídeos apensados aos autos. Consta ainda no susodito Termo de Audiência que a vítima Paulo Cabral Monteiro não compareceu, motivo pelo qual o Ministério Público demanda pela desistência da oitiva da vítima.

Aos Memoriais, o digno representante do Parquet pleiteia a condenação do acusado nos corretivos do art. 155 do Código Penal; a defesa se apresenta às fls. 76-78, alegando a não existência de prova suficiente e sob o fundamento do Princípio do in dubio pro reo, postula pela absolvição do Réu.

Certidão de Antecedentes Criminais consta às fls. 69, denunciando 6 (seis) ocorrências do tipo penal previsto no art. 121, § 1.º, todos arquivados definitivamente, bem como relato sobre o presente feito.

É o que tinha a relatar. Passo a fundamentar e a decidir.


II - Fundamentação
Fonte: Internet.


Como não foram arguidas quaisquer nulidades, passo então a análise do mérito.
A materialidade do crime restou provada, conforme demons­tra o Auto de Prisão em Flagrante e através dos demais documentos que instruíram o presente fascículo processual.

A autoria também ficou evidenciada, mesmo por presunção de responsabilidade, por meio dos depoimentos colhidos durante a fase judicial.

Na análise do caderno policial, em especial, no depoimento da vítima e dos servidores da Polícia Militar, constata-se a autoria do fato, ocorrido na madrugada do dia 17 de outubro de 2010, por volta das 04:30h, conforme indica a denún­cia.

Em seu depoimento ante a autoridade policial, o Réu nega qualquer participação no fato e indica desconhecer o motivo da localização do fruto do delito sobre o telhado de sua residência.

O pleito do nobre Defensor Público não faz jus a prosperar. A apreensão da res furtiva em poder do agente, em situação comprometedora, constitui indício robusto da autoria e materialidade do crime e inverte o ônus probatório, transferindo ao acusado a obrigação de apresentar explicação satisfatória sobre a origem dos bens, sob pena de, não o fazendo, arrostar as consequências do crime patrimonial.

À oitiva das testemunhas arroladas pelo Parquet, os policiais militares esmeraram-se harmônicos e uníssonos no sentido da responsabilização criminal do réu, produzindo robusta validade de seus depoimentos, mormente quando submetido ao crivo do contraditório e corroborado pelas circunstâncias em que ocorreu o crime. Em especial, no depoimento das testemunhas, servidores da PM, J. e L., restou constatada a posse de frutos do ilícito, localizados no telhado da residência do Réu, bem como o arrombamento no local do frigorífico da vítima.

A oitiva do Réu não produziu qualquer justificativa para a posse da res furtiva, nem prova em contrário a seu favor.

Aos Memoriais não se encontram fato ou fundamento que se possa usar em benefício do acusado.

Nos crimes contra o patrimônio, em regra praticados na clandestinidade e sem testemunhas presenciais, para justificar a condenação basta a existência de provas que indiquem, com certeza, a autoria, como no caso, porque o réu não forneceu qualquer explicação plausível para justificar a presença da coisa subtraída em seu poder. Esse entendimento está pacífico nas decisões pretorianas, conforme se toma abaixo:

Ementa: APELAÇÃO CRIMINAL - FURTO QUALIFICADO - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - APREENSÃO DA RES FURTIVA EM PODER DO AGENTE - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - CONDENAÇÃO MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO. Não há que se falar em absolvição, se o conjunto probatório é firme e consistente em apontar o cometimento do furto pelo réu, já que a res furtiva apreendida em poder do agente, gera a presunção da responsabilidade penal, invertendo o ônus da prova, do qual não se desincumbiu a defesa. TJ-MG - Apelação Criminal APR 10431130063909001 MG (TJ-MG). Data de publicação: 25/09/2013

Ementa: APELAÇÃO CRIMINAL - IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA - RECEPTAÇÃO - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - APREENSÃO DA "RES FURTIVA" EM PODER DO AGENTE - PRESUNÇÃO DE RESPONSABILIDADE - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - CONDENAÇÃO MANTIDA - PENA - REDUÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - ALTERAÇÃO DO REGIME PRISIONAL - VIABILIDADE - INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 269 DO STJ - RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. Presume-se a responsabilidade do acusado encontrado na posse da coisa subtraída, invertendo-se o ônus da prova, transferindo-se ao agente o encargo de comprovar a legitimidade da detenção da "res furtiva", mormente se não há prova da escusa apresentada. "É admissível a adoção do regime prisional semi-aberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a quatro anos se favoráveis as circunstâncias judiciais." TJ-SP - Apelação APL 00759492620138260050 SP 0075949-26.2013.8.26.0050 (TJ-SP). Data de publicação: 17/04/2015.

Ementa: APELAÇÃO. FURTO COM EMPREGO DE CHAVE FALSA. (1) MATERIALIDADE E AUTORIA SUFICIENTEMENTE PROVADAS. (2) DEPOIMENTOS DE AGENTES PÚBLICOS. VALIDADE. (3) APREENSÃO DA "RES FURTIVA" EM PODER DO AGENTE. (4) PENA E REGIME QUE NÃO COMPORTAM REPAROS. (5) RECURSO DEFENSIVO DESPROVIDO. 1. No caso dos autos, a conjugação dos elementos probatórios leva ao suficiente grau de certeza quanto à materialidade e à autoria dos fatos descritos na denúncia. 2. Os policiais e demais agentes públicos não estão impedidos de depor. Os seus testemunhos são válidos e devem ser considerados quando da análise do conjunto probatório, salvo motivo concreto a ensejar suspeição. Precedentes do STF e do STJ. 3. A apreensão do bem subtraído em poder do réu é circunstância assaz comprometedora que leva à necessidade de demonstração da causa legitimadora da posse. Precedentes do TJSP. 4. A pena foi corretamente calculada, com exasperação na primeira etapa, ante o elevado valor do bem subtraído, e com atenuação na segunda fase, pela menoridade relativa. Parâmetros de exasperação e de atenuação compatíveis com o caso concreto. O regime aberto não foi impugnado pelo Ministério Público, motivo pelo qual ficou preclusa a questão, em todo benéfica ao sentenciado. A negativa de substituição também foi acertada, ante as circunstâncias judiciais desfavoráveis. 5. Recurso defensivo desprovido. TJ-MG - Apelação Criminal APR 10105130115741001 MG (TJ-MG). Data de publicação: 09/10/2015.

Ementa: APELAÇÃO CRIMINAL - ROUBO SIMPLES - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS - PALAVRA DA VÍTIMA CORROBORADA PELA APREENSÃO DA RES FURTIVA EM PODER DO AGENTE - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - FARTO CONJUNTO PROBATÓRIO - CONDENAÇÃO MANTIDA. Impossível a absolvição do agente quando o conjunto probatório que comprova a autoria e materialidade do crime é constituído de elementos robustos de prova, em especial pela palavra firme e coerente da vítima corroborada pela apreensão da res em seu poder, gerando a presunção da responsabilidade penal. Data de publicação: 09/01/2014.

No presente feito, está cristalina a aplicabilidade da Presunção de Responsabilidade, dada a injustificada apreensão da res furtiva em poder do acusado.


III - Dispositivo

Fonte: Internet.



Diante do exposto, tudo bem visto e examinado, considerando o que consta dos presentes autos e fundamentos jurídicos aplicado à espécie, emanados da doutrina e da jurisprudência pátria, julgo procedente o pedido formulado na denúncia de fls. 2 até 4 para CONDENAR o acusado F., já qualificado nos autos, nas sanções do art. 155, § 4.º, inciso I e IV, do Código Penal Brasileiro.


IV – Dosimetria e Fixação da Pena


Considerando, na primeira fase, as Circunstâncias Judiciais à luz do art. 59 do Código Penal, vislumbro (a) Culpabilidade: há reprovabilidade acentuada na conduta ético-jurídica do acusado que voluntariamente assumiu a conduta de furtar a vítima, mediante o concurso de outra pessoa. Acrescento que o réu se mostrou frio e obrou com dolo manifestado em grau elevado, com consciência plena da ilicitude de seus atos, sendo-lhe perfeitamente exigível conduta diversa e compatível com o preconizado pelo direito. (b) Antecedentes: há anotações de antecedentes criminais, consoante a certidão de fls. 69, onde consta um número de 6 (seis) acusatórias de homicídio, embora que arquivadas. (c) Conduta Social: não há registros de que o réu tem má conduta social, embora tenha dito ser usuário de bebida alcoolica. (d) Personalidade: não há registro sobre a personalidade do réu. (e) Motivos do Crime: com a negativa de autoria, resta prejudicada a motivação do delito. (f) Circunstâncias do Crime: o réu facilitou em muito o desfecho da ação criminosa, pois pré-ajustou o momento adequado da empreitada delituosa, praticando o crime na calada da madrugada para perpetuar o delito. (g) Consequências do Crime: houve prejuizos financeiros para a vítima, posto que parte dos bens subtraidos foram destruídos, prejudicando assim a atividade profissional da vítima. (h) Comportamento da Vítima: a vítima não contribuiu ou facilitou o evento.

Dessa forma, tudo visto à ótica da análise acima, fixo a pena base no mínimo legal, elevando-o em 6 (seis) meses pelas circunstâncias, totalizando em 02 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e ao pagamento de 10 (dez) dias multa, cada um no equivalente a um trigésimo do salário-mínimo vigente ao tempo do fato delituoso, observado o disposto no art. 60 do Código Penal.

Na segunda fase, à mingua de quaisquer circunstâncias atenu­antes ou agravantes, mantenho a reprimenda mínima aplicada na fase primeva.

À terceira fase encontra-se a causa de aumento de pena pela duplicidade das qualificadoras do furto, pelo que elevo a pena em 2 (dois) anos, fixando-a em 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de reclusão e ao pagamento de 10 (dez) dias multa, à luz do art. 49 do Código Penal, que torno definitiva, a míngua de quaisquer outras causas de diminuição ou de aumento.

Em obediência ao disposto no art. 33, § 2.º, alínea b, do Código Penal, determino o regime inicial semiaberto para o cumprimento da pena.

Após o trânsito em julgado, lance-se o nome do acusado no livro "Rol dos Culpados", expedindo-se em seguida, as competentes Cartas de Guia para o cumprimento desta sentença, oficiando-se ao Tribunal Regional Eleitoral, a fim de proceder a suspensão dos direitos políticos do apenado, enquanto estiverem cumprindo a pena, ex-vi do art. 15, III da Constituição Federal, após então, desde já, determino o arquivamento definitivo dos autos.

Publique-se, registre-se, intimem-se e cumpra-se.

Juiz de Direito



Minuta: Acelino Pontes


Fale com o autor.




Para citar este documento (ABNT/NBR 6023: 2002):

Pontes, Acelino: Sentença: Furto duplamente qualificado com concurso de agentes. Praxis Jurídica, Ano III, N.º 04, 05.11.2016 (ISSN 2359-3059). Disponível em: <http://praxis-juridica.blogspot.com.br/2016/11/sentenca-furto-duplamente-qualificado.html>. Acesso em:



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